quinta-feira, 26 de julho de 2007
TEMPO É ASSASSÍNIO
TEMPO É ASSASSÍNIO
>
>Robert Kurz
>
>Que o tempo é dinheiro e nada mais, já o capitalismo sabia antes de
>Karl Marx. O tempo linear abstracto da economia empresarial
>corresponde ao "trabalho abstracto", ao dispêndio de "nervo, músculo
>e cérebro" que há que optimizar para o fim em si da valorização do
>capital monetário – com indiferença face ao conteúdo e face à saúde
>dos trabalhadores. A máquina social capitalista faz também do ser
>humano uma máquina. Já nos tempos do milagre económico foi observado
>que o ritmo do tempo de trabalho apodera-se até do "tempo livre". A
>corrida geral contra o tempo tornou-se precisamente o signo da
>sociedade pós-moderna da aceleração. O filósofo Paul Virilio falou
>em "pausa frenética". No Japão deu que falar o "Karoshi", a morte
>repentina em serviço no sagrado local de trabalho.
>
>A crise mundial da terceira revolução industrial levou a loucura do
>trabalho ao paroxismo. Quanto mais o desemprego e o subemprego
>alastram, tanto mais descaradamente se espreme até ao tutano os
>orgulhosos ocupantes de postos de trabalho. Seja nas fábricas dos
>conglomerados ou entre o pessoal das empresas de serviços, seja nos
>privatizados correios e caminhos de ferro ou mesmo nos templos do
>capital financeiro: em toda parte uma só pessoa tem de desempenhar as
>tarefas que antes eram de três ou quatro. Nos EUA e na Argentina veio
>a público que os supermercados distribuiram fraldas às empregadas das
>caixas, para que elas não "roubassem tempo" à economia da empresa com
>as suas necessidades fisiológicas. A ocupação total vem a par da
>humilhação, tudo em nome das necessidades da rentabilidade.
>
>Mas de maneira nenhuma a lufa-lufa do trabalho atinge apenas as
>camadas inferiores das cadeias globais de criação de valor. Uma vez
>que a máquina de combusão de seres humanos não se alimenta só
>de "músculo", mas também de "nervo e cérebro", também não são
>poupados os "oficiais e sub-oficiais" da muito invocada sociedade do
>conhecimento. Quando, no início de 2007, um jovem advogado financeiro
>da renomeada sociedade de advogados "Freshfields Bruckhaus" se lançou
>do sétimo andar do museu londrino Tate Modern, ouviu-se lamentar: "A
>City devora os seus filhos". Apesar da perspectiva de um salário
>anual de 1 milhão de libras para breve, o ambicioso elemento da elite
>não aguentou mais as jornadas de 16 horas, sete dias por semana, a
>que o imperativo "up or out" obrigava. Ao mesmo tempo foi conhecida
>uma série de suicídios no centro de tecnologia da Renault. Um
>director de informática lançou-se para a morte, um engenheiro
>altamente qualificado afogou-se num lago próximo, um outro enforcou-
>se na sua residência. Como pano de fundo está o programa de
>saneamento "Renault Contrat 2009", o qual acaba em psicoterror entre
>os trabalhadores de topo, com críticas negativas na presença dos
>colegas.
>
>Tais acontecimentos, abordados mediaticamente com completa
>impotência, são apenas a ponta do iceberg. Tempo é dinheiro, ou seja,
>assassínio. Possivelmente ainda vamos ver empresários modelos a pôr
>fraldas de manhã cedo, para não desperdiçar, com desnecessárias idas
>à casa de banho, o precioso tempo do seu cérebro. Fraldas
>descartáveis para todos e "Karoshi" para todos, então talvez se
>consiga mais facilmente aguentar o estremo escachar dos rendimentos e
>talvez a "retoma" possa prosseguir. É preciso aceitar que entretanto
>as panes e as catástrofes se acumulem, pois, de todo o modo, o que
>conta no capitalismo virtual não é a qualidade do conteúdo. Para uma
>cultura de combustão universal impõe-se também a obrigação de uma
>corajosa autocombustão.
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