sexta-feira, 27 de agosto de 2010

O império da despolitização

Império da despolitização

No dia 07 de maio, ainda na fase inicial da disputa para a presidência da República, a Folha de São Paulo (FSP) trouxe uma foto dos três primeiroscandidatos colocados nas pesquisas eleitorais. Ali, Serra abraça Marina e Dilma. Claro: todos sorriem. Título da matéria: “Serra diz que vai querer PTe PV no governo se for eleito”. Noutro momento (23/maio), o mesmo veículo estampou a seguinte manchete decapa: “Lula articula seu futuro na ONU ou no Banco Mundial”. Só faltouinserir o FMI, o que não causaria estranhamento a ninguém que estejainformação sobre a trajetória política de Lula e de tantos outros“companheiros” do novo partido da ordem. Com apenas esses dois exemplos é possível dimensionar a perda política quetivemos nos últimos anos. Do primeiro destaque, a fala de Serra comprova quenão há mais oposição ao sistema. Todos seguem as diretrizes de um estadoneoliberal, ditadas por organismos internacionais, como o Banco Mundial e oFMI. A diferença é a composição de grupos que ocupam e/ou possam vir aocupar cargos. Aliás, brigas internas são mais intensas e verdadeiras do queencenações vistas nos horários de propaganda gratuita entre partidos. Esseteatro desprovido de conteúdo pode criar ilusões aos menos avisados de quealgum partido dos citados possa ser oposição. Detalhe: nem cor e nem gênero(masculino ou feminino) muda alguma coisa. No mundo inteiro, o capital temrecrutado novos agentes, sejam pretos, gays ou mulheres. Seja como ou quem for, a “ordem” será mantida sob falso manto de um“progresso para todos”. Do real progresso, nos últimos anos, só a elite desempre foi a que efetivamente se apossou. A voracidade de banqueiros eempresários foi ímpar na história do país. Para turvar olhos, lembrandoVidas Secas, de Graciliano Ramos, aos atuais fabianos brasileiros foramdadas migalhas por meio de humilhantes bolsas (Família, Escola etc.). Nãohouve real divisão alguma do bolo. Sob perfeita maquiagem, houve crimepolítico e golpe econômico contra os miseráveis. Em recente pesquisa foiexposto: o Brasil é um dos países mais desiguais do planeta. O fato é o que PT também está nos braços da elite. Basta ver quem temfinanciado suas campanhas. Na FSP de anteontem, Breno Costa informa que asdoações ao Diretório Nacional/PT já são “o dobro do arrecadado pelos seispartidos da coligação PSDB”. Até julho, empresas já haviam doado 43,7milhões; ou seja, “mais de 1.500% superior ao mesmo período de 2006”, quandoLula foi reeleito. Isso é nadar de braçada na grana da elite. A retribuiçãodesses gordos “mimos” é obrigação cartorial. Sobre o futuro de Lula, fico estarrecido não com suas intenções pessoais,mas com o silêncio e/ou com a conivência política de tanta gente, destacando“intelectuais” que atuam nas universidades. Nem falo daqueles que já mamamnas tetas do governo. Nesses casos, a conivência e o silêncio têm explicaçãoóbvia: foram cooptados. Trato dos que não se beneficiam disso. Parece queperderam a língua ou sofreram de amnésia. Esqueceram a história. E algunslecionam História! Que irresponsabilidade! Que mundo repleto de falsaigualdade estamos legando às novas gerações! Quanta despolitização! Vale dizer: há algum tempo, a manchete sobre o futuro de Lula poderia causarconvulsão política, levando os mais exaltados ao cardiologista ou a óbito.“Imagine, nosso líder operário ser agente do Banco Mundial ou do FMI!”Calúnia da direita! Hoje tudo pode. Até parece bonito. Não é incrível?Alguém mudou. Pergunto: quem? O Banco Mundial e o FMI – execrados numpassado – ou o próprio Lula e seus antigos e barbudos “companheiros”? Alguémresponde ou as linguinhas continuarão mudas? ROBERTO BOAVENTURA DA SILVA SÁ - Dr. em Jornalismo/USP e Prof. de Literaturada UFMT FONTE: http://www.diariodecuiaba.com.br/Quarta feira, 25 de agosto de 2010Edição nº 12796 25/08/2010

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